Quando conhecidos me encontram na rua e me perguntam para que curso entrei e eu respondo "Astronomia", as reacções são as mais diversas e, muitas vezes, bem surpreendentes. Desde uma expressão de quem viu a Maria de Lurdes Rodrigues nua (sim, essa mesma com que vocês estão agora), acompanhada por um "Eaugh" de repúdio e enojamento, passando por um "As...como!? Oi!?" até ao muito frequente "Gastronomia!?" e o pensamento subsequente do tipo "aquele é maricas, vai para cozinheiro". O que vale, é que há uns poucos que conhecem a palavra e o curso e lá dão aquelas opiniões cientificamente fundadas do tipo "Cromo!" ou "Ah..." E naquele momento de hesitação em que parece que vão dizer qualquer coisa mais, estão simplesmente a pensar "Pobre coitado. Não tinha média para mais nada. Deve ter sido a última opção".
Depois disto, lá vem a perguntinha da praxe (e sabendo eu neste momento, melhor que nunca o que esta palavra significa): E isso tem saída? (Leia-se “isso” como "essa coisa asquerosa à qual alguns chamam curso") Eu lá respondo, peremptoriamente: Em Portugal não, mas por essa Europa fora o que faz falta são astrónomos. Não é que em Portugal haja muitos. O problema é que nem sítio para trabalhar há!
Independentemente de tudo isso, hoje em dia ninguém pode ir para um curso SÓ porque tem saída. Eu podia ter caído nesse erro, e bem posso agradecer às pessoas que me abriram os olhos a tempo, especialmente à minha namorada e também aos papás, o facto de não ter ido para Engenharia Mecânica, ou outra Engenharia Qualquer. Sim, porque engenharia está na moda. E está na moda dizer que engenharia tem saída. Até se podem formar 5 mil engenheiros por ano... Que há saída para eles todos! Acham mesmo? Acham mesmo que esses médicos e biomédicos e cardiopneumonologistas, ou neurofisiologistas, ou fisioterapeutas que estão a ser formados vão ter TODOS saída só porque estão na área da saúde? Bem podem rezar para que venha uma grande epidemia. Meus amigos, quem é bom tem saída, sempre! Quem é mau, arrisca-se a andar ao sabor do vento. A nossa sociedade meritocrática obriga-nos a ser, não dos melhores, mas os melhores, estejamos em saúde, engenharia, área de investigação, ensino, etc.
Há ainda outros factores que influenciam em muitos casos, na escolha do caso. Felizmente comigo não aconteceu isso, mas o facto é que há muita gente em Portugal que ainda tem o estigma que há cursos e profissões mais prestigiantes que outros. Médicos e advogados, por exemplo. Basta terem a licenciatura em Medicina ou Direito que são logo todos Senhor Doutor para aqui, Senhor Doutor para acolá. O Astrónomo e o Físico são aquele tipo de profissões que nem cabe no leque das profissões. "Ah, eu só Astrónomo" "Ah sim? E qual é o teu emprego?"...
É um facto que a investigação científica, nomeadamente, no campo das ciências (ditas) exactas, em Portugal, não é vista com o prestígio e a seriedade que deviam. Basta ver que um médico, sem grande esforço aufere mais de 2 mil euros por mês. Um físico que não seja brilhante, vive da esmola que a bolsa do estado dá! Escusado será dizer que se for brilhante, faz as malas e goodbye Portugal comment allez vous estrangeiro!? E depois, claro que há aquela imagem que o cientista é aquele gajo barbudo, velho e louco! Só um louco, um velho mesmo gágá, pode pensar que se pode fazer ciência (na acepção bruta da palavra) em Portugal!
Depois claro, o bom aluno, média de 19, pais ricos, da classe alta burguesa, até tem uma paixão pela cosmologia, até tem interesse pela astrofísica, até é um aluno brilhante a matemática, mas com as pressões da família, os estereótipos da sociedade (ser bom aluno sem se ir para medicina é uma oportunidade desperdiçada), o apoio que é dado à Ciência no nosso país e tudo o mais, fazem com que ele, ainda que algo relutante e duvidoso, entre para medicina.
Meus amigos, nós desperdiçamos dezenas de Stephen Hawking's e Albert Einstein's todos os anos! Podemos ter aniquilado o descobridor português da Teoria Unificadora das Forças. E, por causa disto, deitamos fora também milhares de pessoas com grande vocação para serem médicos, heróis salva-vidas, à custa de míseras décimas, por vezes! Há muita coisa injusta de facto nisto tudo, e há que se repensar muito nisto.
E tudo isto para dizer o quê? Vocês, que ainda estão no Secundário, ou até no Básico, ao fazerem as vossas opções, não olhem para aquilo que os outros fazem ou dizem ou que tem saída, mas para aquilo que vocês gostam de fazer. Acreditem no que eu vos digo. Serão mais felizes sendo bioquímicos orgulhosos do que sendo médicos frustrados. Fechem os olhos e pensem bem no vosso sonho. Concentrem-se nele, lutem por ele, e quando o agarrarem... Façam-se à vida!
Ok! Não liguem a nada do que eu disse! Não se pode acreditar no que um Astrólogo nos diz... Ah! Pois! Astronomia é diferente de Astrologia... Só para o caso de não saberem...